Linhão de Tucuruí ameaça fragmentar Reserva Florestal Adolpho Ducke do Inpa
Pesquisadores do Inpa visitaram a reserva para discutir a localização mais apropriada para os corredores ecológicos
O trecho da subestação Lechuga-Jorge Teixeira, que passa por dentro Ducke, ameaça isolar a Reserva das matas primárias do Puraquequara. Uma parte da área da quina sudeste da Reserva já foi desmatada
Por Luciete Pedrosa - Ascom Inpa
Foto: Paulo Maurício - Acervo Inpa
A Reserva Florestal Adolpho Ducke do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa/MCTI) teve uma parte de sua área desmatada pela Eletrobrás. A empresa interferiu na quina sudeste da reserva, numa área de cerca de 5.900 metros quadrados, para receber as linhas de transmissão de energia vindas da hidrelétrica de Tucuruí (PA), no trecho da subestação Lechuga-Jorge Teixeira.
Pesquisadores do Inpa se mostraram contrários ao corte de floresta. Eles temem pela fragmentação da reserva e propõem que se façam dois corredores ecológicos, cada um cerca de mil metros de largura por quatro quilômetros de extensão, com o objetivo de manter a conectividade da Reserva Ducke com a mata primária da área do Puraquequara. A passagem do linhão e os desmatamentos já realizados pela Eletronorte ameaçam severamente a conectividade florestal.
Com a interferência realizada pela Eletrobras, várias árvores da Reserva Ducke perderam suas copas nas margens do desmatamento. Segundo o pesquisador Paulo Maurício de Alencastro Graça, coordenador de Dinâmica Ambiental do Inpa, a desestruturação do dossel da floresta permite uma maior entrada de luz no interior da mata, deixando-a mais propícia a incêndios florestais.
“Trabalhos publicado pelo Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos Florestais (PDBFF/ Inpa) mostram também que as árvores localizadas nestas bordas são mais afetadas por vento, aumentando a queda de árvores”, disse o pesquisador.
O Inpa constituiu uma comissão técnica para avaliar os impactos que o linhão poderá causar na reserva.No último dia 20, técnicos do Inpa e da Eletrobras visitaram a reserva para discutir a localização mais apropriada para os corredores ecológicos.
O linhão da Eletrobrás, que é interligado à subestação de Lechuga-Jorge Teixeira, localizada no quilômetro 22 da rodovia AM-010 (Manaus-Itacoatiara), gerará energia de alta tensão com capacidade de 230 kV. Essa subestação afeta áreas de pesquisas e um dos três acampamentos da Ducke, o Ipiranga, além das grades (áreas) de estudos permanentes da biodiversidade na reserva. A Ducke possui ainda os acampamentos Bolívia e Tinga. A obra do linhão é uma promessa para acabar com os problemas de energia elétrica no Amazonas e conectar a Região Norte ao Sistema Interligado Nacional (SIN).
Segundo o pesquisador Paulo Maurício, o linhão da Eletrobrás ameaça aumentar a vulnerabilidade da Reserva Ducke ao desmatamento e ao corte ilegal de madeiras com a presença de algumas estradas no interior da reserva. “O linhão está dando mostra que facilita o acesso à floresta para as práticas de crimes ambientais, como a caça, corte ilegal de árvores e ocupação irregular”, alertou.
Para a pesquisadora do Inpa e membro da comissão técnica, a bióloga e doutora em Ecologia dos Ecossistemas, Rita Mesquita, a intenção inicial da Eletrobrás era passar o linhão por fora da reserva. “Agora, a empresa informou ao Inpa, por meio de ofício, que o linhão já está passando por dentro da Reserva Ducke”, revelou.
Impactos ambientais
De acordo com o pesquisador e químico Adrian Pohlit, que também é coordenador de Tecnologia e Inovação (Coti/Inpa) e colabora com a Comissão, os impactos de ter a Reserva Ducke isolada da mata primária não são totalmente conhecidos, mas implicariam no isolamento de espécies que poderão vir a morrer por falta de mobilidade. “Nisso reside a importância da criação do corredor ecológico”, destaca.
O Inpa pleiteia da Elebrobras a manutenção da integridade da conectividade de parte da floresta debaixo de um trecho do linhão, com a criação do corredor, no qual as matas seriam mantidas ou até replantadas para garantir a proteção de animais e seu movimento entre a Reserva Ducke e o Puraquequara.
“Queremos manter a conectividade arbórea que assegure aos animais passarem de um lado para o outro sem ser atropelado ou eletrocutado”, reforça a pesquisadora Rita Mesquita.
Para os pesquisadores, a chegada de energia para Manaus é muito bem-vinda. “Mas o linhão não deve fragmentar um patrimônio institucional, pondo em risco a extinção de espécies animais já ameaçadas e levando à destruição da flora que é estudada no Inpa e por outras instituições de fora por décadas”, desabafa Pohlit.
Reserva Adolpho Ducke
A Reserva Florestal Adolpho Ducke, localizada no quilômetro 26, da AM-010, é uma área de 10 mil hectares (como se fosse um grande quadrado no mapa de 10 km x 10 km) de mata de terra firme e serve como suporte para vários segmentos das pesquisas do Inpa e de outras instituições nacionais e internacionais.
Está cercada pela cidade e sofre com a pressão urbana. A reserva abriga uma infinidade de plantas e animais e é uma das áreas mais bem estudadas da Amazônia brasileira.
Dentre as espécies mais comuns encontradas na Ducke estão cutias (Dasyprocta leporina); esquilos (Sciurusw aestuans), veados (Mazama americana), antas (Tapirus terrestri) e furões (galictis vittata), além de macaco-prego (Cebus apella), saguim-de-coleira (Sagnus bicolor), parauacu (Pitehecia pithecia), guariba (Aloutta macconnelli), cuxiú (Chiropotes sagulatus), onça-pintada (Panthera onca), onça parda (Puma concolor), tamanduá-bandeira (Myrmecophaga tridactyla), raposas (Cerdocyon thous), cachorro-do-mato (Speothos venaticus), preguiça-real (Choloepus didactylus), dentre outras.
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