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Pesquisadores do Inpa realizam captura inédita de quelônios Mata-matás no AM

  • Publicado: Terça, 18 de Março de 2014, 20h00
  • Última atualização em Terça, 14 de Abril de 2015, 09h06

 

Após 25 anos de pesquisas com quelônios amazônicos, pesquisadores capturam 28 Chelus fimbriata (mata-matá) durante uma expedição de 20 dias, considerada a maior captura do mundo para a espécie

Por Luciete Pedrosa

Pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa/MCTI) realizaram a captura inédita de 28 adultos da espécie de quelônio Chelus fimbriata (em latim significa tartaruga franjada ou ornamentada) conhecida popularmente por mata-matá (ou matamatá). De acordo com os cientistas essa captura é a maior do mundo para a espécie de quelônio. Não há notícias de uma população com o número tão elevado de indivíduos numa só região por conta da sua raridade e pela dificuldade de capturá-lo.

“Podemos dizer que é um marco na área da herpetologia (estudo de répteis e anfíbios) porque esses animais eram capturados de forma isolada e em diferentes regiões. O que chama atenção é que essa espécie é rara e encontramos os animais concentrados em um só local. Até o momento, não há nenhum registro na literatura científica de captura para uma população desse porte”, explica o mestrando Fabio Cunha, um dos participantes da expedição que fez a descoberta.

A descoberta desses 28 espécimes aconteceu durante uma expedição de 20 dias, liderada pelo pesquisador do Inpa, Richard Vogt, no período de 17 de fevereiro a 10 de março pelo Médio e Alto rio Negro na região entre os municípios de Barcelos (a 454 km de Manaus) e Santa Isabel do Rio Negro (a 781 km de Manaus). Os pesquisadores identificaram 27 machos e uma fêmea.

A expedição faz parte das pesquisas para a titulação de mestrado de Fábio A. G. Cunha, estudante do Programa de Pós-Graduação em Biologia de Água Doce e Pesca Interior (PPG-BADPI) do Inpa cuja tese tem como título: “Bioacumulação de mercúrio e seu efeito genotóxico em Chelus fimbriata (SCHNEIDER, 1783) em ambientes fluviais do Médio e Alto rio Negro (AM)”.

A pesquisa

A pesquisa é orientada pelo doutor em Ecology and Behavioral Biology pela University of Minnesota System (Estados Unidos) Bruce Forsberg e coorientada pelo doutor em Zoology pela University of Wisconsin (Madison, Estados Unidos) Richard Carl Vogt, e pela doutora em Ecotoxicologia pela Université du Québec à Rimouski (Canadá) Fabíola Xochilt Domingos, todos pesquisadores e professores do Inpa.

O pesquisador Richard Vogt explica que um dos objetivos dessa expedição para coleta de Chelus fimbriata é caracterizar a ecologia trófica (cadeia alimentar) por meio de isótopos estáveis (metodologia utilizada cujo objetivo é, dentre outras, determinar em qual posição na cadeia alimentar o animal se encontra), bem como avaliar a bioacumulação do mercúrio (acúmulo do metal pela ingestão de alimentos) e seu efeito genotóxico (dano celular após exposição a um agente mutagênico) nessa espécie.

A espécie foi escolhida para essa pesquisa porque o mata-matá é um excelente modelo para estudos de bioacumulação de mercúrio. “É um animal predominantemente carnívoro, alimentando-se quase exclusivamente de peixe, por isso acumula o mercúrio ao longo da cadeia trófica, sendo mais facilmente possível determinar o dano genotóxico”, explica o mestrando Fábio Cunha.

De acordo com Richard Vogt, para conseguir a localização de uma boa população desse quelônio, os pesquisadores montaram uma grande estrutura para 'correr' atrás desses animais pelos rios da Amazônia e contaram com o apoio essencial dos pescadores da região, que relataram sempre avistar aqueles animais “estranhos” nos rios. O pesquisador conta que após 25 anos de pesquisas com quelônios amazônicos, agora, conseguiu encontrar uma grande população de Chelus fimbriata.

Vogt afirma que foi vasculhando no fundo dos lagos e igarapés que continham, às vezes, cerca de 30 centímetros de folhas e galhos secos, e com visibilidade quase zero, revirando troncos e galhos, que os pesquisadores conseguiram localizar os quelônios enterrados no fundo dos ambientes aquáticos.  

Coleta

Durante a captura, os pesquisadores coletaram amostras dos animais como: a retirada de fragmentos de músculos para a determinação de mercúrio e análises de isótopos estáveis. Também foram realizadas medidas morfométricas, que compreendem comprimento e largura da carapaça e do plastrão (escudo ventral presente nos quelônios), além da pesagem de cada indivíduo.

Em alguns desses animais capturados foram colocados equipamentos de rádio transmissores para o monitoramento mensal de suas áreas de uso com o objetivo de entender, por exemplo, a história natural desse animal, além de rastrear seu deslocamento, hábitat, dieta, período e local de reprodução.

Crendices

“É um animal muito interessante pelo comportamento atípico dentre os quelônios, atrelado a ele crendices e superstições sendo, sem dúvida, um dos quelônios amazônicos que mais causa interesse dentro da herpetologia e da população em geral”, comenta Richard Vogt.

Cunha explica que o mata-matá não é consumido pela população por causa de sua aparência externa ser um tanto diferente dos demais quelônios. Sua carapaça é cheia de pontas e os ribeirinhos atribuem a ele superstições e lendas. “Algumas pessoas o chamam de “banco do cão” e atrelam certo medo na sua captura. Uma das defesas desse animal é exalar um forte odor e regurgitar alimentos na pessoa que o está manipulando, por isso os pescadores evitam capturá-lo”, diz.

O mestrando ressalta ainda a necessidade de estudos científicos para espécies cujo conhecimento ainda é incipiente. “É imponderável os estudos no qual utilizam como modelo biológico espécies que ainda não temos tanto conhecimento, uma vez que muitas espécies correm o risco de tornarem-se extintas sem sequer conhecermos sua história de vida”, diz Fábio.

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