Simpósio Internacional apresenta biotecnologias para produção e conservação de peixes
Evento que ocorre pela primeira vez na América Latina reúne em Manaus maiores autoridades mundiais em fisiologia da reprodução de peixes
Por Cimone Barros – (texto e fotos) Ascom Inpa
Para se ter produção de piscicultura de alta qualidade e fazer conservação de espécies têm de investir em pesquisa. O alerta é do 11º Simpósio Internacional de Fisiologia Reprodutiva de Peixe, que reúne em Manaus os mais renomados especialistas mundiais da área. Técnicas e biotecnologias modernas do mais alto nível científico são apresentadas até esta sexta-feira, no Tropical Hotel.
Em 40 anos, esta é a primeira vez que o Simpósio ocorre na América Latina. Mais de 200 pesquisadores, profissionais e estudantes de 30 países participam do evento. Cerca de 40% dos participantes são do Brasil. Dos 16 renomados especialistas que fazem palestra, apenas dois são do Brasil: Samyra Lacerda, professora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), e Ronaldo Barthem, pesquisador do Museu Paraense Emilio Goeldi (MPEG).
De acordo com o presidente do evento e diretor do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa/MCTIC), Luiz Renato de França, os peixes constituem o grupo mais diverso e abundante de vertebrados do mundo com quase 30 mil espécies, das quais 13 mil são de água doce e aproximadamente 3 mil estão na Amazônia.
“Só isso já mostra a importância do evento para a região, porque hoje grande parte dos peixes consumidos no mundo é cultivada, produzida em tanques e esse é o futuro da piscicultura”, disse França. “Então, para se chegar a um nível de produção de alta qualidade e rentável tem de fazer pesquisa; pesquisa de fertilização, sobrevivência da larva, patologias, ração e tudo mais. Esta é uma vertente que esperamos que resulte em frutos no futuro”, completou.
Além de França, participaram da mesa de abertura na segunda-feira (04) o presidente da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (Fapeam), Edson Barcelos, e os pesquisadores Rüdiger Schulz (Países Baixos) e Adelino Canário (Portugal).
Transplante de células germinativas
Precursor da área de transplante de células germinativas em peixe, Goro Yoshizaki da Universidade de Ciência e Tecnologia Marítima de Tóquio (Japão), fez a palestra de abertura. Autoridade mundial na área, Yoshizaki utiliza tecnologias em que transplanta células de uma espécie de peixe em outra espécie visando a conservação de peixes em perigo de extinção, produção econômica e a própria biologia reprodutiva por lidar com muitos aspectos desconhecidos. No Japão, a fonte de proteína mais importante é o pescado.
“Muitas vezes em cativeiro é difícil manipular, mas com criopreservação consigo congelar óvulos e espermatozoides em nitrogênio líquido de uma espécie ameaçada. E quando eu precisar de indivíduos daquela espécie posso descongelar as células e colocá-las em outra espécie, como numa barriga de aluguel, e gerar indivíduos da espécie ameaçada”, explicou o pesquisador japonês.
A técnica desenvolvida por Yoshizaki pode usada para repovoar rios com espécies em risco de extinção ou extintas, incluindo espécies usadas como alimento ou como peixe ornamental. “Recuperar o meio ambiente leva muito tempo e a técnica permite ter essas espécies preservadas em banco de esperma e óvulo. Seria como um seguro que pode ser usado quando for preciso”, revelou.
A primeira barriga de aluguel usada pelo pesquisador foi o salmão para produzir truta e depois o contrário: a truta como barriga de aluguel para produzir óvulos de salmão, já que o salmão do Pacífico depois da primeira reprodução vive um ou dois anos e morre. Já com a truta, que leva de dois a três anos para se reproduzir, isso não acontece e pode todo ano continuar produzindo óvulos de salmão.
“Eu conheço pouco a realidade amazônica, mas o ser humano está colocando mais espécies de peixes a beira da extinção no mundo todo. E acredito que minhas técnicas possam ser usadas para preservar espécies daqui para serem usadas no futuro quando os rios daqui que estão poluídos forem recuperados”, contou.
Yoshizaki mantém colaboração com o laboratório do França, na UFMG. Aqui no Brasil, França usa a tilápia como modelo experimental por ser fácil de se manter em laboratório e de ser uma espécie de significativa importância econômica. A tilápia é investigada pela equipe de França como peixe-receptor - barriga de aluguel - para o pirarucu, peixe nativo da Amazônia, de alta importância econômica, mas que demora a se reproduzir levando de quatro a cinco anos, com produção de poucos alevinos e baixa viabilidade das larvas.
Apresentações orais
Para permitir que todos os participantes acompanhem as palestras plenárias e as apresentações orais, o Simpósio não possui sessões paralelas. Ele é realizado todo em inglês e sem traduções simultâneas.
Um dos posters do evento é do professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Danilo Streit Jr. que apresentou trabalho sobre a reprodução da piracanjuba, espécie parente muito próximo da matrinxã e da jatuarana e que no Brasil é uma espécie bioindicadora em perigo de extinção. Em seu laboratório, o professor desenvolve trabalho de reprodução especialmente para verificar a influência da temperatura na determinação sexual desse animal.
Para isso, o estudo previamente estabeleceu como funciona a parte hormonal para determinar o sexo do macho e da fêmea, e agora a equipe do professor investiga a determinação sexual a partir da influência da temperatura. A hipótese do estudo é que a temperatura mais alta verificada no ambiente tem produzido um número quase que exclusivamente de machos, o que é considerado “muito ruim”. “Trabalho há 15 anos com piracanjuba e a gente tem verificado sistematicamente esse problema”, revelou.
Segundo Streit Jr., há essa tendência e a espécie está sofrendo consequências drásticas do aquecimento global e das ações humanas. “As usinas hidrelétricas através de programas ambientais repõem esses animais através do processo de povoamento, o problema é que um grande número dos animais é de machos e não se estabelece uma população pelo baixo número de fêmeas”, explicou.
O professor conta que se trabalhado para reverter o quadro, mas a quantidade de fêmeas é cada vez menor. “Se não houver trabalho para determinar qual a temperatura ideal para produzir esse animal e produzir uma relação equivalente macho-fêmea ao longo do tempo as fêmeas vão sumir e consequentemente a espécie que já foi muito consumida e hoje quase não se encontra mais no Sul do País”.
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