Especialistas debatem em Roda de Conversa Ética na pesquisa com seres humanos
Toda pesquisa com ser humano precisa passar por um Comitê de Ética para que seja aprovada. No Inpa, o Comitê de Ética em Pesquisa com seres humanos fica localizado no térreo da Diretoria
Por Karem Canto – Ascom Inpa
Fotos: Luciete Pedrosa
“Pensar nas pesquisas com seres humanos, na postura correta do pesquisador e nas dificuldades na hora da avaliação dos projetos de pesquisas pelo Comitê de Ética é fundamental”. A afirmação é da mestre e doutoranda em Antropologia Social pelo PPGAS do Museus Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Marlise Rosa, em bate-papo da Roda de Conversa sobre “Ética na pesquisa com seres humanos”, no Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa/MCTIC).
Para Marlise Rosa, o procedimento de informar a finalidade da pesquisa para os grupos para os quais se trabalha, além da consciência dos dados que se produz e dos usos e das repercussões que esses dados possam ter são os princípios básicos éticos e morais para qualquer pesquisador que esteja trabalhando diretamente com outro ser humano.
“Você tem todas essas implicações de fazer pesquisas com seres humanos”, diz a doutoranda. “Nas Ciências Humanas e Sociais a gente acaba tendo uma dificuldade muito grande por conta de as pesquisas nesta área estarem subordinados à normatização oriunda do Conselho Nacional de Saúde, cujas premissas e problemáticas se pautam na biomedicina”, acrescenta Marlise.
Segundo o secretário do Comitê de Ética em Pesquisa com seres humanos (CEP), o servidor Augusto Vital, toda pesquisa com ser humano necessita passar por um Comitê de Ética para que seja aprovada e, posteriormente, publicada. “O Instituto analisa todas as pesquisas necessárias, desde um questionário com perguntas até uma análise clínica”, destaca, acrescentando que, por essa análise ética, é feito um parecer que autoriza ou não que a pesquisa seja realizada.
Para Vital, uma das principais dificuldades do CEP é que as pessoas não buscam conhecer as normas que tratam da ética em pesquisas com seres humanos. Na visão do secretário do CEP, a partir do momento em que as pessoas começarem a entender que existe essa necessidade legal, essas dificuldades irão desaparecer. “Não é algo difícil ou ruim. O que acontece é que as pessoas realmente não sabem que existe”, diz ele, lembrando que a legislação das pesquisas com seres humanos data de mais de 20 anos (1996).
Em 2016, o CEP/Inpa recebeu 41 projetos de pesquisa envolvendo seres humanos para serem avaliados. O envio de projetos acontece de forma contínua, e o Comitê tem o prazo de 40 dias para avaliar o projeto: são dez dias para checagem de documentos, e havendo aceitação total, mais 30 dias para o Comitê emitir o parecer inicial. O coordenador do CEP é o pesquisador Cristóvão Costa, doutor em Microbiologia (Virologia).
Na opinião do pesquisador do Inpa, George Rebelo, um dos convidados da Roda de Conversa, há uma preocupação de levar os projetos para obter a aprovação do Comitê de Ética. “É uma tendência crescente, hoje, impulsionada pela dificuldade de se publicar um artigo sem a aprovação do CEP”, diz.
O pesquisador destaca que outros aspectos precisam de atenção, como o uso das metodologias participativas e suas abordagens. Segundo Rebelo, muita gente, hoje, tem se utilizado de metodologias participativas porque são técnicas poderosas capazes de gerar uma grande quantidade de informação em pouco tempo. “Isso também termina sendo uma informação que, por ser compartilhada por grupos sociais, é difícil de ser particularizada. Então, a exposição ao risco se dá da mesma forma”, ressalta.
A 3ª edição da Roda de Conversa aconteceu na última quarta-feira (10), na sala de Estudos da Biblioteca do Inpa, e contou com a presença do diretor Luiz Renato de França, pesquisadores, professores e estudantes de pós-graduação. A atividade é uma iniciativa da Coordenação de Extensão (Coext) do Inpa, sob a responsabilidade da pesquisadora Rita Mesquita. O objetivo é estimular o debate sobre assuntos de interesse da comunidade, buscando a construção de uma visão mais cidadã sobre os assuntos em foco.
Os encontros mensais são abertos ao público externo e interno da Instituição e acontecem na segunda quarta-feira de cada mês, às 16h, na Sala de Estudos da Biblioteca do Inpa, situada no Campus I, bairro Petrópolis, Manaus (AM). O próximo tema será sobre “O acesso ao conhecimento tradicional e a partição de benefícios”.
Pesquisas na Antropologia
Segundo Marlise Rosa, a Comissão Brasileira de Antropologia, por meio do GT de Ética, desde 2013, trabalha para a construção de uma resolução específica no que toca às pesquisas de Ciências Humanas e Sociais. “Essa resolução, depois de muita luta, de muitas críticas ao que se entende como autoritarismo e corporativismo das áreas biomédicas, conseguiu, no ano passado, ser aprovada”, conta.
Segundo ela, apesar de ser algo recente que ainda está em discussão, sendo revisto e problematizado, essa resolução, que regulamenta as pesquisas nas Ciências Humanas e Sociais é um passo muito interessante para que possa conseguir pensar, de novo, numa forma enquadrada eticamente. “Muito embora a Associação Brasileira de Antropologia tenha seu Código de Ética, que é o que acaba orientando as nossas pesquisas. Nele, todos esses direitos do antropólogo, enquanto pesquisador, são subordinados aos diretos da população com as quais ele trabalha”, ressalta.
Um ponto positivo para a debatedora é o fato de terem o próprio Código de Ética aqui que regulamenta e condiciona as pesquisas. “A gente consegue ter um certo conhecimento das pesquisas que são feitas. Já teve casos de antropólogos que foram desligados da Associação Brasileira de Antropologia justamente por não estar cumprindo essas deliberações éticas de pesquisas” afirma.
Dentro da Antropologia, um exemplo claro dos usos desses dados e das proporções que as pesquisas tomam é a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Fundação Nacional do Índio (Funai) e do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). De acordo com Marlise, uma CPI que foi criada em 2015, recriada em 2016 e semana passada divulgou o relatório. Nele, há uma lista enorme de antropólogos, agentes indigenistas, procuradores da república e lideranças indígenas indiciados.
“A CPI foi criada sob interesse da bancada ruralista justamente para estar revendo os laudos antropológicos no que toca a demarcação das terras indígenas. Esses antropólogos são acusados de associação criminosa, incitação ao crime, falsidade ideológica, entre outras coisas”, disse Marlise. “Ou seja, isso ilustra muito o nosso fazer antropológico, o nosso comprometimento político, ético com essas questões e as proporções que isso toma. O exemplo da CPI é muito claro nesse sentido”, completou.
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