Inpa realiza expedição para inventário da biodiversidade em rios entre Nova Olinda do Norte e Maués, no Amazonas
A expedição faz parte de um projeto institucional do Inpa que busca fazer a caracterização e prospecção de novos insumos da biodiversidade do Médio Rio Negro com potencial biotecnológico
Por Luciete Pedrosa e Cimone Barros – Ascom Inpa
Foto: Acervo pesquisador Efrem Ferreira
Um grupo formado por 23 pesquisadores, estudantes e técnicos do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa/MCTI) parte nesta segunda-feira (03) para uma expedição de nove dias em três rios do Amazonas, localizados na bacia do rio Madeira onde foram construídas as hidrelétricas de Santo Antônio e Jirau (Rondônia). A finalidade é fazer um inventário das espécies de peixes, insetos, aves, plantas, algas e também caracterizar os tipos de água nos rios Canumã, Abacaxis e Marimari, localizados numa região entre os municípios de Nova Olinda do Norte e Maués, no Amazonas.
A expedição envolverá especialistas de diferentes áreas do conhecimento, que vão realizar estudos para se conhecer a biodiversidade dos locais, levando em consideração que é uma região onde existe um contato de diferentes tipos de águas (pretas, claras e brancas) e que poderá eventualmente refletir na composição da biodiversidade.
O trabalho de coleta amostral deste ano é uma complementação de uma expedição realizada em setembro de 2014 para outra região, entre os rios Marauiá (Santa Isabel do Rio Negro) e Jufari (Barcelos), na margem esquerda do rio Negro, onde é estudada a possibilidade de instalação de hidrelétricas na Amazônia. Além do inventário, a proposta é entender as diferenças entre os animais e plantas nos diferentes tipos de águas e ecossistemas.
Segundo o responsável pela expedição, o pesquisador do Inpa Efrem Ferreira, os rios Canumã e Abacaxis, situados entre os municípios de Maués e Nova Olinda do Norte, são afluentes de água preta e de água clara e que deságuam no Paraná do Urariá, que é de água branca. “Essa área é interessante para a prospecção da biodiversidade, pois estudos anteriores mostraram uma relação entre a fauna de peixes do rio Abacaxis e do rio Negro”, conta.
O rio Abacaxis é um rio de água preta, onde há ocorrência de peixes que só eram conhecidos para a bacia do rio Negro, como o cará-papagaio (Hoplarchus psittacus) e cardinal (Paracheirodon axelrodi). “Aparentemente, o Abacaxis pode ter tido uma antiga conexão com o rio Negro”, conta o pesquisador.
Segundo Ferreira, a primeira expedição na margem esquerda do rio Negro foi realizada durante cerca de 20 dias na época da vazante, e a ideia inicial era repeti-la nos mesmos locais, porém, na época da enchente. Isso, segundo Ferreira, permitiria estudar, por exemplo, outras espécies de plantas (que já estariam florescendo), de peixes (que estariam se movimentado em diferentes épocas) e a própria qualidade da água (que poderia ser diferente).
“Como os recursos disponíveis não eram suficientes para refazer a expedição nos mesmos moldes e locais, pensamos em realizar outra que envolvesse água preta, em diferentes tipos de água com a biodiversidade”, explica Ferreira.
As expedições fazem parte um projeto do Inpa que busca fazer a caracterização e prospecção de novos insumos da biodiversidade do Médio Rio Negro com potencial biotecnológico. O projeto é financiado pela Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (Sudam).
Ornitologia
Para aumentar o conhecimento sobre a biodiversidade da região, as diferentes áreas do conhecimento têm seu próprio jeito de trabalhar para fazer as amostragens e inventariar o ambiente a ser estudado. De acordo com pesquisador do Inpa Mario Cohn-Haft, o enfoque da ornitologia (estudo das aves) nessa expedição será catalagar os pássaros de igapó, a mata alagada ao longo do rio.
“Estou muito curioso para saber se algumas das espécies que a gente costuma associar com o rio Negro estão nessa região de Maués, porque também tem água preta, já que não estamos mais na bacia do rio Negro”, revelou Cohn-Haft.
Segundo o especialista em pássaros, o bacurau-de-cauda-barrada (Hydropsalis leucopyga), conhecido pelo povo como “tabaco-fraco” por conta do canto, por exemplo, ocorre na Amazônia inteira, principalmente na região de águas brancas. Outro bacurau (H. latifascia) que é quase idêntico, mas recentemente descobriu-se tratar de outra espécie e que nem sequer foi batizado com nome popular, está mais presente na água preta.
“Este bacurau que tem um canto bem diferente, lembrando um sapo cururu, foi descoberto na região do Alto Rio Negro, mas estou apostando que terá na região de Maués também quando a gente estiver na água preta e que na água branca terá o outro, o bacaurau-de-cauda-barrada. Vai ser gostoso confirmar isso”, conta Cohn-Haft.
As aves são um dos grupos de organismos mais estudados da biologia. O Brasil e a Colômbia são os países com o maior número de espécies de aves conhecidas, aproximadamente 1.900 em cada um. Na Coleção de Aves do Inpa há cerca de 700 espécies tombadas e 2.500 exemplares não tombados, ou seja, que ainda precisam ser identificados para só depois serem inseridos no banco de dados do Instituto.
Recursos hídricos
Durante a expedição, a equipe de Limnologia (estudo das águas) irá verificar se os rios são realmente de águas claras ou de águas pretas, ou se possuem características “mistas”, como foi observado, em 2014, em alguns rios da margem esquerda do rio Negro. “Também serão coletadas amostras de macroalgas e plâncton (organismos microscópicos que vivem ‘flutuando’ naturalmente na água) para observar se eles mudam de local para local”, explica a pesquisadora de Recursos Hídricos do Inpa, Domitila Pascoaloto.
“Os estudos que estão sendo realizados nos rios da Amazônia são importantes para que consigamos compreender melhor as características físicas e químicas e suas interações com variáveis hidrobiológicas dos rios da Amazônia, mas principalmente para encontrar padrões nos rios de águas “mistas”. Os estudos são importantes também para que consigamos entender a relação dessas águas com o plâncton e macroalgas, comunidades que podem, direta ou indiretamente, estarem relacionados com a composição da entomofauna aquática ou com a ictiofuana no local”, disse Pascoaloto.
De acordo com a pesquisadora, espera-se ter informações suficientes a respeito da qualidade da água e sobre a diversidade de espécies de algas planctônicas obtidas em cada amostra de ambiente para verificar até que ponto a tonalidade da água é explicada pelos sólidos em suspensão. Além disso, espera-se também, saber se a cor verdadeira e demais características químicas da água dos rios de água escuras, associadas ao rio Madeira e adjacentes, são semelhantes àquelas observadas na bacia do rio Negro, em 2014.
A pesquisadora explica que, na década de 1950, o pesquisador alemão Harold Sioli classificou os rios da Amazônia em três tipos: água preta (rio Negro), água branca (rio Solimões) e água clara (rio Tapajós). “Atualmente, alguns rios com características químicas de água clara podem, em sua aparência (“cor visual”), serem confundidos com os de água preta, como acontece com o rio Trombetas, em Oriximiná (PA), ou com os de água branca, como rio Branco (RR) em alguns períodos do ano”, contou a pesquisadora.
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